Há dois anos, na reta final para as eleições municipais, encontrei e li por acaso O Crepúsculo do Macho, de Fernando Gabeira, então candidato à prefeitura do Rio de Janeiro. Por pura coincidência, nesta semana final de campanha para as eleições na qual Gabeira é candidato novamente, encontrei também por acaso o livro que segue o anterior, Entradas e Bandeiras. No mesmo estilo autobiográfico da série que começa com O que é isso, companheiro?, Entradas e Bandeiras fecha a trilogia contando sua volta ao Brasil após o longo exílio no exterior.
Em 1979, tendo ficado famoso por ter participado do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, Gabeira era tido como um símbolo da luta contra a ditadura, naquele momento em que a sociedade brasileira começava a sair do jugo dos militares e ansiava pela liberdade. Uma grande festa foi armada no aeroporto no momento de sua chegada, todos queriam uma palavra sua, uma atitude de um líder que guiasse as pessoas na direção da democracia. Entretanto, após dez anos de experiências em diversos países, em contato com novas ideias, Gabeira simplesmente estava em outra sintonia - situação já discutida em seu livro anterior -, mais preocupado com ambientalismo e opressão sexual do que com a luta da esquerda. "Entradas e Bandeiras" trata basicamente da relação de Gabeira com o Brasil e do Brasil com Gabeira: o homem, estrangeiro em seu próprio país, e o país decepcionado, mas ao mesmo tempo fascinado com a aquele estranho, se sentindo traído e atraído por ele.
Uma das passagens do livro remete a uma memória de sua infância, a história de um homem que foi à Lua, criando toda uma expectativa na população, mas quando voltou, simplesmente colocou um ovo. Uma situação ridícula, que reflete o que ocorria em sua vida: todos esperavam um guerrilheiro andando por aí com uma metralhadora na mão, mas o que se via era uma pessoa com roupas extravagantes, de sexualidade duvidosa, tendo largado o fumo e a bebida, mas abraçado de vez a maconha e a campanha pela sua legalização, comendo em restaurantes naturais ou tomando sol com sua controversa tanguinha no posto nove de Ipanema - que na verdade não era de crochê, explica o autor, mas pertencia sim à sua prima Leda Nagle. Isso tudo gerava um quadro muito ambíguo, sendo Gabeira odiado por diversos setores da direita e da esquerda, porém cada vez mais atraindo os holofotes para si, com requisições constantes de entrevistas e artigos e o sucesso do lançamento de seu primeiro livro. O que se percebe em Entradas e Bandeiras é um homem feliz, resolvido, disposto a agir como mais lhe conviesse e lhe fosse correto, sem se importar muito com a mentalidade tacanha da maioria dos brasileiros de então (não muito diferentes dos de hoje). Se em O Crepúsculo do Macho Gabeira parecia estar mudando, e talvez até sofrendo com isso, aqui ele já tinha escrachado de vez.
Entredas e Bandeiras é mais um ótimo livro de Fernando Gabeira, divertido, de escrita agradável, porém não sem recursos ou estilo, ao ponto de poder ser facilmente lido de uma vez só em algum dia livre. É um livro muito mais fácil que o anterior, com uma marcação temporal mais compreensível, passado em locais mais familiares à maioria dos leitores brasileiros, e abordando ideias e acontecimentos em vez de sentimentos. Mais leve e concreto, o relato de um perspicaz intérprete das situações absurdas da sociedade e uma clara indicação do porquê das seguidas derrotas de Gabeira nas eleições para cargos executivos, que dependem de votação muito expressiva: sem entrar aqui no mérito de propostas de campanha ou da trajetória política do candidato, o grosso do eleitorado brasileiro nunca vai compreender e aceitar ideias tão avançadas, mesmo que hoje em dia Gabeira não fique mais propagando-as por aí - pelo menos propositalmente, lembram-se da história da "mentalidade suburbana", na campanha de 2008? Por conta de suas posições revolucionárias, fosse com arma na mão, fumando maconha ou indo à praia de tanga feminina, enfim, tudo que foi escrito em O que é isso companheiro?, O Crespúsculo do Macho e Entradas e Bandeiras, a pequenez da mentalidade brasileira sempre irá considerá-lo algo como viado, maconheiro ou sequestrador.
Editora: Codecri
Páginas: 208
Disponibilidade: esgotado
Avaliação: * * * * *
Em 1979, tendo ficado famoso por ter participado do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, Gabeira era tido como um símbolo da luta contra a ditadura, naquele momento em que a sociedade brasileira começava a sair do jugo dos militares e ansiava pela liberdade. Uma grande festa foi armada no aeroporto no momento de sua chegada, todos queriam uma palavra sua, uma atitude de um líder que guiasse as pessoas na direção da democracia. Entretanto, após dez anos de experiências em diversos países, em contato com novas ideias, Gabeira simplesmente estava em outra sintonia - situação já discutida em seu livro anterior -, mais preocupado com ambientalismo e opressão sexual do que com a luta da esquerda. "Entradas e Bandeiras" trata basicamente da relação de Gabeira com o Brasil e do Brasil com Gabeira: o homem, estrangeiro em seu próprio país, e o país decepcionado, mas ao mesmo tempo fascinado com a aquele estranho, se sentindo traído e atraído por ele.
Uma das passagens do livro remete a uma memória de sua infância, a história de um homem que foi à Lua, criando toda uma expectativa na população, mas quando voltou, simplesmente colocou um ovo. Uma situação ridícula, que reflete o que ocorria em sua vida: todos esperavam um guerrilheiro andando por aí com uma metralhadora na mão, mas o que se via era uma pessoa com roupas extravagantes, de sexualidade duvidosa, tendo largado o fumo e a bebida, mas abraçado de vez a maconha e a campanha pela sua legalização, comendo em restaurantes naturais ou tomando sol com sua controversa tanguinha no posto nove de Ipanema - que na verdade não era de crochê, explica o autor, mas pertencia sim à sua prima Leda Nagle. Isso tudo gerava um quadro muito ambíguo, sendo Gabeira odiado por diversos setores da direita e da esquerda, porém cada vez mais atraindo os holofotes para si, com requisições constantes de entrevistas e artigos e o sucesso do lançamento de seu primeiro livro. O que se percebe em Entradas e Bandeiras é um homem feliz, resolvido, disposto a agir como mais lhe conviesse e lhe fosse correto, sem se importar muito com a mentalidade tacanha da maioria dos brasileiros de então (não muito diferentes dos de hoje). Se em O Crepúsculo do Macho Gabeira parecia estar mudando, e talvez até sofrendo com isso, aqui ele já tinha escrachado de vez.
Entredas e Bandeiras é mais um ótimo livro de Fernando Gabeira, divertido, de escrita agradável, porém não sem recursos ou estilo, ao ponto de poder ser facilmente lido de uma vez só em algum dia livre. É um livro muito mais fácil que o anterior, com uma marcação temporal mais compreensível, passado em locais mais familiares à maioria dos leitores brasileiros, e abordando ideias e acontecimentos em vez de sentimentos. Mais leve e concreto, o relato de um perspicaz intérprete das situações absurdas da sociedade e uma clara indicação do porquê das seguidas derrotas de Gabeira nas eleições para cargos executivos, que dependem de votação muito expressiva: sem entrar aqui no mérito de propostas de campanha ou da trajetória política do candidato, o grosso do eleitorado brasileiro nunca vai compreender e aceitar ideias tão avançadas, mesmo que hoje em dia Gabeira não fique mais propagando-as por aí - pelo menos propositalmente, lembram-se da história da "mentalidade suburbana", na campanha de 2008? Por conta de suas posições revolucionárias, fosse com arma na mão, fumando maconha ou indo à praia de tanga feminina, enfim, tudo que foi escrito em O que é isso companheiro?, O Crespúsculo do Macho e Entradas e Bandeiras, a pequenez da mentalidade brasileira sempre irá considerá-lo algo como viado, maconheiro ou sequestrador.
Editora: Codecri
Páginas: 208
Disponibilidade: esgotado
Avaliação: * * * * *
Viado com i mesmo, veado refere-se somente ao animal.
ResponderExcluirOlá Fernando é em relação ao documentário Civilizações Antigas,são na realidade 4 DVD's. O que postei no blog foi o primeiro DVD que encontrei nos meus arquivos (nem lembrava mais que tinha ele) só tenho o primeiro DVD, vou ver ser encontro o restante na internet.
ResponderExcluirValeu!
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