quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Suave é a Noite - F. Scott Fitzgerald

A popularidade dos livros de Francis Scott Fitzgerald tem aumentado nos últimos anos, graças a grandes produções de Hollywood  como O Curioso Caso de Benjamin Button e O Grande Gatsby, e novas edições estão sendo lançadas a cada estreia no cinema. Com roteiros baseados na obra de um dos maiores escritores de todos os tempos, seria bem difícil que um filme desse tipo não vingasse - pelo menos o que vi, O Curioso Caso..., é excelente. Quanto ao lançamento de novas edições, é uma oportunidade para o público médio conhecer livros que realmente importam, já que, impulsionados pelo sucesso dos filmes, essas novas edições ganham uma exposição privilegiada nos centros das livrarias ao lado de best-sellers consumidos por esse público voraz por coisas como 50 Tons de Cinza ou a última canastrice do Dan Brown. Esse ano O Grande Gatsby ganhou até uma bela edição bilíngue de capa dura pela editora Landmark, minha chance de reler esse livro tão importante para mim, agora na língua original (e com a molezinha da tradução logo ao lado).

Com a maior exposição dos livros de Fitzgerald nas livrarias, muitos que comprarem no oba-oba do filme podem gostar, não gostar, ou sequer um dia vão ler, mas alguns terão nesses lançamentos uma porta de entrada para o restante da obra desse mestre. O livro de Fitzgerald sobre o qual resolvi escrever é um desses livros que não tem tanta repercussão na carreira de um escritor em meio ao eclipse que um Grande Gatsby pode causar na literatura (a não ser que venha a ser filmado com o DiCaprio), mas nem por isso deixam de ser arrasadores. Suave é a Noite já começa a ser um grande livro desde antes de ser aberto pelo leitor, pois só o título já pode despertar vários tipos de sentimentos - aqueles que escolhem essa hora suave para ler ou fazer qualquer outra coisa vão entender ainda mais essa beleza de título. 

Depois dessa primeira impressão, uma capa com um título desse e o nome de um autor peso pesado, Suave é a Noite tem diversos outros motivos para ser considerado um grande livro. Um dos últimos trabalhos de Fitzgerald, este livro mantém a mesma qualidade narrativa dos anteriores, mas se diferencia de todos os outros por trazer uma maior carga autobiográfica, e talvez por isso o que ele considerava sua melhor criação. À época da produção do livro (que foi lançado em 1934), Zelda Fitzgerald, sua esposa, havia sido internada em uma clínica com diagnóstico de esquizofrenia, após anos de uma violenta relação entre os dois. Scott Fitzgerald havia perdido o pai em 1931 e mantinha um hábito que trazia desde sua juventude: bebia muito acima do padrão considerado "social". Durante sua internação, Zelda escreveu Save me the Waltz (sem tradução para o português), um livro mal recebido e cheio de passagens autobiográficas sobre a vida do casal. Essa publicação de sua vida pessoal enfureceu Scott Fitzgerald, e talvez por isso ele tenha dado uma resposta colocando seu ponto de vista sobre essa relação doentia em Suave é a Noite.

O livro começou a ser desenvolvido logo após o lançamento de Gatsby, porém com uma temática bem diferente. Com os contornos dramáticos que dominavam a vida de Fitzgerald, o enredo foi modificado, utilizando-se as passagens já escritas e os personagens numa nova perspectiva. A história se passa em torno de Dick e Nicole Diver (as representações de Scott e Zelda), um casal americano endinheirado e hedonista vivendo na costa sul da França, em meio e festas e eventos sociais com amigos. Sua situação é cômoda, eles são admirados como um casal perfeito numa vida perfeita, até que começam a aparecer evidências de uma situação explosiva guardada num lugar onde o mundo não pode ver. Esse tema da relação doentia entre duas pessoas é abordado em todo o livro, utilizando-se flashbacks paralelos ao desenvolvimento dos acontecimentos entre Dick e Nicole. Fitzgerald coloca tudo o que lhe fazia sofrer em sua vida nas páginas do livro: seu relacionamento frustrado, seu alcoolismo, sua degradação, a morte de seu pai, os problemas mentais de Zelda.

Geralmente é recomendado que o leitor tenha o primeiro contato com um trabalho mais famoso de determinado autor, mas se alguém ler Suave é a Noite como iniciação a F. Scott Fitzgerald não vai se arrepender. E quem já o conhece por Gatsby ou Benjamin Button e está doido para continuar a explorar esse universo tenso e encantador, esse é o caminho. Um livro estupendo, de construção e desenvolvimento de enredo e beleza que não é qualquer um que consegue, mas não é uma beleza para levantar o astral de ninguém: é uma beleza como a suavidade da noite, que às vezes pode ser melancólica, solitária e triste, bem triste.

Editora: Bestbolso 
Páginas: 448
Disponibilidade: normal
Avaliação: * * * * *

Só para constar: Suave é a Noite já foi filmado em 1962...

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Collected Poems 1947-1997 - Allen Ginsberg

Como dito anteriormente aqui no blog, a poesia é um ramo de leitura recente para mim. Não me interessou em grande parte da minha vida simplesmente porque eu não conhecia poesia - quer dizer, poesia de qualidade. Achava ridículo aquele tipo de poema todo rimadinho - e ainda acho -, sem graça, preso em seus próprios códigos de conduta, até que comecei a descobrir que a poesia poderia ser tão radical e revolucionária quanto uma prosa solta de um Henry Miller, e vai muito além de coisas medíocres como o parnasianismo que a gente aprende na escola.

Allen Ginsberg chegou a mim através de meu interesse pela prosa beat. Pesquisando sobre os autores pelos quais me interesso, descobri ali no meio deles esse poeta que me surpreendeu e me tomou coração e mente de assalto. Ginsberg é um dos maiores poetas da língua inglesa de todos os tempos. Inspirado em gente importante como William Blake e Walt Whitman, mas sem que isso interferisse em sua originalidade, Ginsberg iniciou sua carreira nos anos quarenta, formando o núcleo do que seria a geração beat, ao lado de outros importantes escritores como seu amigo Jack Kerouac.

Assim como meus autores prediletos de prosa, Ginsberg representa para mim muito mais do que um autor importante pela sua técnica: ele diz o que eu quero ouvir, escreve o que eu estava esperando ler, o que eu precisava conhecer antes de morrer. Eu não tenho interesse em saber se Vinícius de Morais tem medo de amar (e pior ainda se ele faz isso em versinhos rimados...). Me fascina muito mais um cara que viu as melhores mentes de sua geração "destruídas pela loucura, famintas, nuas", como contou Allen Ginsberg. Presente em um dos momentos mais importantes e apaixonantes da história de literatura (e da humanidade em geral), Ginsberg viu, viveu e escreveu um mundo de sexo, amor, drogas e lutas políticas como poucos. Sua poesia é excelente por si só, mas uma pesquisa paralela sobre sua biografia é essencial para essa experiência de leitura.

Collected Poems 1947-1997 abarca toda a obra poética de Allen Ginsberg, em ordem cronológica. Um livro monumental, com mil e tantas páginas, passando por todas as sua fases, várias leituras e releituras para a vida. Existem diversas traduções de Ginsberg para o português, mas nenhum trabalho como esse, completo, e além do mais, se prosa já é uma coisa meio complicada de se ter traduzida, poesia é para mim inconcebível, perde-se completamente o sentido - é claro que, se quisermos conhecer a fundo a poesia do mundo, dependeremos uma hora ou outra de uma tradução, não vou aprender russo só para conhecer Maiakovski -, mas para autores em inglês ou espanhol que são línguas comuns para nós, vale o esforço da interpretação pessoal no original.

Editora: Harper Perennial
Páginas: 1191
Disponibilidade: importado
Avaliação: * * * * *