sábado, 30 de outubro de 2010

1001 Livros para ler antes de morrer

JustificarO livro que faltava aqui no blog, na minha estante, enfim, no cotidiano de qualquer um que gosta de ler. Seguindo o padrão da série "1001", este volume segue uma linha cronológica dividida em quatro partes:

- Antes de 1800, que gasta não mais do que 60 páginas com uma época em que a literatura se desenvolvia lentamente, começando por "1001 noites", que faz um inevitável trocadilho com o título. Dos poucos livros considerados dignos de entrar nessa lista inicial, há coisas obscuras, como histórias da China e do Japão medievais, porém há também clássicos absolutos, como Voltaire, Sade, Cervantes e Goethe.

- Anos 1800, quando o bicho começa a pegar. Aqui passamos a falar dos monstros da literatura, aqueles clássicos irrefutáveis para os críticos literários que praticamente fundaram a literatura moderna, alguns realmente indispensáveis, como Vitor Hugo, Julio Verne e Émile Zola, ao lado de outros que ninguém tem coragem de tirar de uma lista dessas, mas que nada mais são do que leituras anacrônicas e chatíssimas, que só permanecem nas estantes por consideração à linha evolutiva da literatura. Aí eu colocaria o morno Charles Dickens e os insuportáveis Stendhal e José de Alencar. Digamos que metade das páginas dessa parte despertam meu interesse, até porque entendo que ainda falta muita coisa dessa época para eu conhecer, como os grandes autores russos, por exemplo.

- Anos 1900. Meu interesse sério começa aqui, onde estão 90% dos autores que revolucionaram minha vida e tornam minha realidade mais suportável. Estamos falando de um tempo onde o mundo virou de cabeça para baixo como nunca antes desde a queda do Império Romano, um tempo de violência ao extremo e loucura caminhando lado a lado com progresso científico e tecnologia de ponta, no qual as pessoas comuns olham a sua volta e simplesmente não sabem o que fazer ou pensar sobre isso - mas Eles sabem. Estamos falando de Kafka, Henry Miller, Huxley, Hemingway, Fitzgerald, Lima Barreto, Sartre, Orwell, Borges... Sei lá, nem consigo classificar direito esses caras, tanto que pouco escrevo nesse blog sobre alguns deles, só sei que se eu não os conhecesse ou fosse impedido de conviver com eles, teria menos alguns motivos para continuar vivo. Ao lado dessas feras, muita coisa que não conheço ainda e que me foram apresentadas por este livro, muita coisa aparentemente do mesmo naipe dos meus autores prediletos, e que já comecei a correr atrás para conferir.

- Anos 2000, onde estão as novidades literárias do nosso tempo, as quais conheço muito pouco - dos cerca de 50 livros listados, li apenas um. Não é preconceito por obras novas ou saudosismo pelo tempo que não vivi, simplesmente não tinha informações seguras sobre o que ler - mas agora tenho, e já posso me aventurar na literatura de hoje em dia. O que dá para perceber é que nesse período, a literatura abre-se cada vez mais para autores de culturas diferentes, e que a literatura deixa cada vez mais o centro ocidental. Também é notável o aumento do número de autoras, num mercado antes sufocante de tanto testosterona. Eu, como incansável defensor das mulheres, sinto-me meio envergonhado de não conhecer muitas autoras, portanto surge aí a chance de superar essa grave deficiência literária.

"1001 livros para ler antes de morrer" segue a mesma linha dos outros da série, com os mesmos méritos e problemas. E um livro viciante, dentro do qual você pode passar horas sem conseguir voltar para o mundo real, lendo a resenha de livros que já passaram pela sua vida ou descobrindo novos desejos de consumo literário. Por outro lado, numa lista tão extensa, há sempre aqueles livros ruins que você vai se revoltar por estarem ali, como omissões de livros que para você são os melhores de todos os tempos. No meu caso, o mais incompreensível foi a falta dos livros de Homero, talvez porque originalmente era um poema, mas acredito que a questão foi utilizar as "1001 noites" para iniciar o livro sem perder o trocadilho, excluindo assim tudo que veio antes de 850. Ao ler "1001 discos" e "1001 filmes" senti a mesma coisa - como é que podem colocar Britney Spears no lugar de Laughing Clowns?

Outra coisa legal nessa coleção é a questão das capas, que mudam a cada edição. A edição que tenho de "1001 discos" tem como capa uma maravilhosa foto de Sid Vicious, e já vi uma edição importada com um close do lindo rosto da Debbie Harry. "1001 filmes" tem capas melhores ainda, como a expressão maníaca de Jack Nicholson em "O Iluminado", o pavor da cena clássica de "Psicose", Samuel L. Jackson empunhando uma pistola em "Pulp Fiction", Darth Vader (bem, é o Darth Vader, não preciso dizer mais nada), e até novidades como Avatar e o Coringa de Heath Ledger, o que mostra que as edições vão sendo atualizadas a cada ano. A edição que tenho não podia ter uma capa melhor para mim: Harrison Ford, o herói absoluto da década de 80, como Indiana Jones. Em algumas edições, a editora coloca uma capa genérica, como alguém ouvindo música ou lendo um livro, o que acho meio sem graça. Infelizmente esta primeira edição brasileira de "1001 livros" tem uma dessas capas, uma estante cheia de lombadas dos livros abordados, mas já vi boas capas de edições do exterior, como Laranja Mecânica e American Psycho.

Um grave problema que detectei neste livro foi que, em algumas resenhas, o autor conta muito do enredo, talvez até o final, e isso não é coisa que se faça em lugar nenhum do mundo! De qualquer forma, "1001 livros" é fantástico e essencial para leitores de qualquer gosto, assim como outros da coleção. Outros que quero ter aqui na minha estante são "1001 maravilhas naturais para visitar antes de morrer" e "1001 dias que abalaram o mundo", além de "501 grandes artistas" e "501 grandes escritores", que deve ser um simples mais do mesmo de "1001 livros". Já existem também no Brasil "1001 vinhos", que não tenho nenhum interesse porque não aguento essa chatice de enomodinha, e "1001 comidas", que tem na capa uma foto de um crustáceo que automaticamente repele um vegetariano como eu. No exterior já saiu um que parece ser muito divertido, chamado "1001 livros infantis para ler antes de crescer", mas também existe todo o tipo de apelação, como "1001 buracos de golf para acertar antes de morrer" (duvida? veja você mesmo no site da editora).

domingo, 24 de outubro de 2010

Os Segredos do Nazismo - Sérgio Pereira Couto

JustificarA maioria das compras de livros que faço hoje em dia ocorrem pela internet, por comodidade e principalmente pelas promoções que não são encontradas nas lojas físicas, sobretudo nessas épocas de estiagem comercial como agora que ainda não começou a febre consumista do natal. Durante minha última sessão de realizações de pequenos prazeres no site de uma dessas livrarias, me deparei com um livrinho intitulado "Os Segredos do Nazismo", de Sérgio Pereira Couto, de quem eu nunca havia ouvido falar, pelo ridículo valor de R$ 3,50 - o preço cheio era R$ 19,90. É óbvio para quase todo mundo que qualquer produto com um desconto tão acentuado como esse gera logo suspeitas sobre sua qualidade, mas por esse preço resolvi arriscar, o tema me pareceu interessante, mesmo que o subtítulo "Origem, Filosofia, História, Influência, Simbologia" indicasse algo vasto demais para a quantidade de páginas - tratando-se, obviamente, de um livro bastante introdutório, mas como sou professor, às vezes este tipo de material tem utilidade para mim.

Uma desvantagem em compras pela internet é não poder folhear e ler a orelha ou o prefácio do livro. No presente caso eu poderia ter lido, por exemplo, que o autor é um jornalista que já escreveu outros livros como "A Verdade sobre o Código Da Vinci", "Decifrando a Fortaleza Digital" ou "Os Heróis de Esparta", e isso teria me estimulado a não comprar um livro de um autor tão "generalista" como este - como leitor, gosto de ler e aprender um pouco sobre tudo, mas sinto mais confiança em escritores ao inverso disso, ou seja, que escrevem tudo sobre um pouco. Além disso, acho deprimente que alguém baseie seu trabalho no sucesso alheio e utilize isso com fins estritamente comerciais, como os títulos acima indicam (os livros de Dan Brown e o filme "300").

Isso já seria suficiente para largar o livro na prateleira e folhear outro, mas caso ainda houvesse alguma dúvida, eu poderia abri-lo e ler a introdução. Assim eu teria mais um motivo para abandoná-lo após o seguinte parágrafo: "Esse é o segredo do pensamento nazista: a distorção de ideias místicas e esotéricas retiradas de fontes antigas. Por isso é necessário conhecer essas influências e analisar o que gerou o distorcido regime nazista. A história tende a se repetir (grifo meu, boquiaberto), e evitar a ascensão de outros regimes como o da Alemanha dos anos 1940 é extremamente necessário, ainda mais no muno moderno".

Depois dessa, não teria mais motivo algum para continuar com o livro em mãos, mas como já estava aqui em casa mesmo, não custava nada passar rapidamente por breves capítulos como "Discos Voadores Nazistas", "Nazis no Tibete", "O Lado Esotérico da SS" e algo que relacionava o Santo Graal à turma de Hitler. O que pude notar então foi uma péssima escrita e uma pesquisa amplamente baseada em páginas de internet, já que não há nenhum tipo de referência bibliográfica, enquanto os endereços eletrônicos estão esplhados entre todo o texto. Também não há uma linha condutora, sem relação entre os capítulos e sequer uma conclusão ao final. Parece várias reportagens de revistas do tipo Superinteressante reunidas caoticamente.

Em suma, o livro é ruim demais, e mesmo que fosse bom, não tenho nenhum interesse nessas teorias conspiratórias e nesse tipo de "segredo". Como não pude folhear previamente, comprei achando que seria outra coisa, algo mais historiograficamente sério, ou pelo menos didático. Para mim, não valeu nem os R$ 3,50, e nem tenho coragem de dar de presente para ninguém, mas se você acha legal esse tipo de publicação, é por sua conta e risco.

Editora: Universo dos Livros
Páginas: 127
Disponibilidade: normal
Avaliação: zero!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Solaris - Stanislaw Lem

No futuro, entre as inúmeras conquistas espaciais da humanidade está a descoberta do planeta Solaris, desabitado e cuja superfície é um oceano. Seria apenas um entre tantos planetas prestes a ser estudado e desvendado pela mente humana, porém o fato de Solaris resistir a forças que naturalmente teriam provocado sua destruição leva a um impasse entre os cientistas. Existe uma única estação de estudos em Solaris, e mesmo após décadas de estudos, ninguém consegue sequer uma teoria amplamente aceita sobre o segredo do planeta: o oceano seria um ser vivo, inetligente, capaz de determinar sua rota no cosmo e evitar sua destruição?

O problema de Solaris seria menor se não houvesse tantas dificuldades nas tentativas de estudos in loco. Desde o princípio ocorreram acontecimentos estranhos, comportamentos dúbios de profissionais experientes que viveram na estação e alguns acidentes trágicos. Em determinado momento, Kris Kelvin, um cientista e psicólogo especialista em solarística, é enviado para o planeta a fim de auxiliar três pesquisadores que lá permanecem em missão, Snow, Sartorius e Gibarian, aparentemente afetados pela atmosfera venenosa do planeta. Assim começa Solaris, num clima de terror psicológico ao estilo Alien, num local bem distante do conforto da Terra, claustrofóbico e sem saída como a Nostromo daquele filme, mas pelo menos nesse caso o espectador sabe o que é que se esconde nos cantos mal iluminados. Em Solaris não, e isso me causou medo e até um pesadelo durante a leitura.

Apesar de todo esse clima do início, Solaris não é um livro propriamente de terror, mas a atmosfera sombria ajudar a manter no leitor o estado de espírito que o autor tramou para seu protagonista, alguém que chega numa estação num planeta enigmático e nada encontra além de um ambiente desorganizado e pessoas reclusas aparentemente loucas. É uma ficção científica, podendo até ser classificada como hard - livros onde o autor explora profundamente aspectos técnicos da ciência, ao contrário das ficções científicas soft, nas quais as divagações sobre aspectos sociais são mais proeminentes -, mas não é aí que Solaris foca. Stanislaw Lem diferencia sua obra ao lidar sobretudo com o ser humano, orgulhoso porém ridiculamente fraco diante de problemas insolúveis, tanto na ciência como em sua própria mente.

Tentando cumprir sua missão, Kelvin passa a confrontar fantasmas - reais ou ilusões? -, bem como os outros pesquisadores, numa jornada de desconfianças, vilipêndio, vergonha, culpa e aceitação. Solaris e a solarística são explicados ao longo do livro, durante os raciocínios de Kelvin na tentativa de solucionar o misterioso planeta, com tantos detalhes nas citações de obras e estudiosos do tema que parece uma área de conhecimento realmente existente. A escrita de Stanislaw Lem é diferenciada num gênero onde a imaginação se sobrepõe à qualidade da prosa descritiva, e a divagação psicológica é marcante, às vezes de forma sutil, como na apresentação de remorsos sexuais. Solaris é soberbo e essencial, e me estimula a ler outras obras deste grande autor.

Stanislaw Lem (1921-2006) era polonês, e procurava fazer uma ficção científica bem diferente da americana, a qual criticava sem trégua como escrita sem qualidade cheia de clichês. Por este motivo - e por suas constantes controvérsias com outros autores mais populares - demorou a ser aceito no mundo da ficção científica ocidental (já era o mais famoso no mundo socialista), mas posteriormente se tornou um dos autores mais lidos de todos os tempos. Solaris é seu livro mais famoso, e em 1972 foi lançado um filme soviético inspirado na obra - inspirado, pois é uma versão bem pessoal do diretor Andrei Tarkovsky, com bastantes diferenças em relação ao livro, porém nem por isso deixa de ser uma bela película. Há uma refilmagem americana de 2002, com George Clooney, que ignoro e não faço questão de conhecer.

Editora: várias
Páginas: cerca de 220
Disponibilidade: esgotado
Avaliação: * * * * *

Livro Digital


terça-feira, 5 de outubro de 2010

O Homem Invisível - H.G. Wells


O que você faria se pudesse tornar-se invisível? Pode parecer uma questão tola, uma fantasia infantil, mas na verdade é um ponto filosófico interessante, abordado já por Platão em A República, sobre o que o poder pode fazer com a integridade moral dos homens - o mito do anel de Giges, no qual um pastor descobre um anel que o torna invisível, e em posse deste poder, toma o lugar do rei. Baseado nesta reflexão do filósofo grego, Herbert George Wells desenvolveu O Homem Invisível, uma ficção que, além de discutir este aspecto moral, apresentou para os leitores do século XIX questões científicas muito interessantes, que não perderam seu encanto para mentes do século XXI - Que bases físicas permitiriam a invisibilidade? Qual seria a reação de um cachorro frente a um homem invisível? O que aconteceria se este homem engolisse algo ou derramasse alguma substância sobre sua pele?

Ora, independente da moral da pessoa, qualquer um deve achar que seria fabuloso poder tornar-se invisível. Uma pessoa má certamente tentaria levar vantagens pessoais, como o pastor da história de Platão, e uma pessoa boa poderia tentar sanar males da sociedade e lutar pela justiça, como um super-herói, mas o fato é que em todas as histórias em que tal suposição foi abordada - desde Giges até O Senhor dos Anéis, outra cria de Platão -, a ideia era que o poder da invisibilidade fosse reversível, podendo seu possuidor voltar à forma visível e manter uma vida normal. O Homem Invisível de H.G. Wells diferencia-se de todos os outros pelo fato de não possuir essa faculdade. O cientista Griffin desenvolve uma fórmula que torna qualquer ser invisível e, vítima de seu próprio orgulho, utiliza o invento em si mesmo, mas não consegue voltar à sua antiga forma. Em princípio o cientista fica eufórico com todas as possibilidades abertas para si, mas com o tempo ele percebe os diversos empecilhos criados por causa de sua situação peculiar, levando-o à loucura. Desenvolve-se então uma trama com ingredientes de suspense, terror, ficção científica e até um pouco de humor, numa narração em terceira pessoa típica da literatura fantástica do século XIX, onde o autor coloca-se de certa forma como cúmplice do leitor, como se não fosse onisciente e tivesse o mesmo tipo de conhecimento dos outros personagens (visto no trecho "No correr da noite, possivelmente, comeu e dormiu"), o que talvez mexesse mais com a curiosidade dos leitores de então, assim como o uso de pontuações que excitassem sua imaginação ("Seriam passos o que ouvia atrás dele? Mais depressa!").

O Homem Invisível é um livro divertido, sem muita genialidade em seu roteiro, mas com o mérito da criação de uma fantasia original e intrigante até hoje. Imagine o homem invisível querendo ser visível para poder conviver com relativa normalidade com os outros - cobertura total de todas as partes de seu corpo, pois a menor brecha poderia expor sua invisibilidade e fazer com que as pessoas achassem que se tratava de um fantasma. Por outro lado, se ele quisesse aproveitar-se de sua condição, teria que andar totalmente nu, suportando o frio da Inglaterra, onde ocorre a história, e teria que tomar diversos cuidados, como não andar na chuva (já que a água formaria uma silhueta que o denunciaria). Toda essas divagações tornaram O Homem Invisível um clássico indispensável para os amantes da litertura fantástica, bem como H.G. Wells, ao lado de Júlio Verne, um dos pais da ficção científica. Além desse livro, Wells escreveu outros clássicos como A Máquina do Tempo e Guerra dos Mundos.

Editora: várias
Páginas: cerca de 200
Disponibilidade: esgotado
Avaliação: * * * *

Livro Digital

Nota: Existe um filme de 1992 chamado "Memórias de um Homem Invisível", com Chevy Chase, uma leitura moderna da obra, onde o protagonista é caçado pelo governo americano para se tornar um espião. Divertido.