terça-feira, 22 de outubro de 2013

V. - Thomas Pynchon

Em Malta durante a Segunda Guerra Mundial, no Sudoeste Africano Alemão durante o colonialismo, nos esgotos de Nova Iorque da década de 1950, nos palcos da Paris do início do século XX, no Egito dominado por britânicos, numa trama na Florença da virada do século... lá está V... Misterioso, complexo e estranho pra cacete, este livro me despertou sensações tão variadas quanto a diversidade de locais nos quais se passa e personagens que se apresentam para depois não mais aparecerem e, aparentemente, não fazerem sentido algum para o resto da história.

Não que V. seja um daqueles livros que você não entende nada, com pouca trama e muito sentimento. Há bastante enredo no roteiro que varia entre todos os lugares citados acima e uma linha mais clara passada em Nova Iorque em 1956, centrada em dois personagens. Há um sentido e uma ligação entre esses capítulos e os outros, que mais parecem contos isolados, só que eu não sou capaz de explicar como (e até onde sei, todo mundo que lê esse livro sente o mesmo)!

Os dois personagens centrais são Benny Profane, um vagabundo sem direção na vida cuja única preocupação é curtir tudo o que puder acompanhado de seu grupo de amigos batizados como a turma muito doida, e Stencil, um homem que segue a investigação de seu pai à procura de V. O problema é que nem ele sabe o que é V - e nem você vai saber ao terminar a leitura, vai no máximo desconfiar ou presumir o que é. Portanto, como não se pode dizer ao certo o que é V, também não se é capaz de afirmar sobre o que trata esse livro, mas nem por isso a leitura perde sua validade - pelo contrário, o livro teve boa aceitação pela crítica na época e concorreu a prêmios. 

Como eu escrevi no início do texto, V. me proporcionou uma variedade de sensações. Quem acompanha o blog já está ciente de minha clara predileção por autores de meados do século passado, gente que viva e escrevia ao som do jazz e à sombra de cogumelos atômicos compreensivelmente imaginários. Busquei um livro de Thomas Pynchon por ter lido resenhas e artigos bastantes elogiáveis sobre ele, já sabia que era um autor da minha área de interesse. Tanto o estilo sem o formalismo da literatura clássica como os temas abordados me prenderam bastante na leitura, mas algumas partes desse extenso livro podem ser maçantes, sobretudo quando se tem a impressão que nada mais faz sentido, quanto você se pergunta por que o autor está lá na Namíbia no meio da guerra de alemães com os Herero, ou o que uma série de nomes como Venezuela, Vesúvio, Verônica ou Vênus podem ter a ver com V... e não garanto a você que há respostas para essas e outras questões levantadas, ou que magicamente tudo vai fazer sentido quando você chegar na última página, como num conto de Borges. Se você tem interesse e vontade de ler esse livro, minha recomendação é: leia com o compromisso da leitura de um livro difícil, complexo, mas sem a preocupação com uma linha condutora; leia a trama de Nova Iorque de forma encadeada, mas cada capítulo fora dela como se fossem contos independentes, sem se importar em fazer sentido (já que boa parte não vai fazer mesmo!).

V. foi uma leitura estranha por esses motivos, de altos e baixos, mas que eu pretendo repetir futuramente, o que me mostra alguma coisa a mais que conta sobre os baixos, que me faz sentir a necessidade de uma nova leitura e que nessa ocasião será mais bem aproveitada que a primeira. V. é o primeiro livro de Thomas Pynchon, um autor que vive até hoje recluso, com poucas concessões à mídia, e que por isso já gerou inúmeros rumores sobre sua personalidade e real identidade (alguns realmente toscos, como a suspeita de que ele era na verdade o Unabomber...). Durante décadas, só se conhecia uma foto sua, de quando ele tinha 18 anos, mas hoje já se sabe um pouco mais mais sobre ele. Seus outros livros de destaque são O Leilão do Lote 49, considerado mais fácil que os outros e uma porta de entrada para sua obra, e O Arco-Íris da Gravidade, sua novela de maior sucesso. Pynchon ainda vive e lança livros esporadicamente, porém sem a repercussão dos anteriores. Infelizmente, as edições brasileiras de seus livros são geralmente caras e algumas estão esgotadas, mas podem ser encontradas baratas em sebos.

Editora: Paz e Terra
Páginas: 559
Disponibilidade: esgotado
Avaliação: * * * *