terça-feira, 24 de agosto de 2010

A Voz do Fogo - Alan Moore

O que pode haver em comum entre uma jovem queimando na fogueira em 1705, uma forja de falsificação de moedas em 290, a cremação do corpo de um bruxo em 2500 a.C. e o incêndio de um carro em 1931? Alan Moore, o maior de todos os escritores de quadrinhos, juntou estas e mais algumas narrativas em sua estreia na literatura para narrar, através da Voz do Fogo, a história de sua cidade natal, Northampton, na Inglaterra.

Por meio de doze contos, narrados em primeira pessoa, o célebre autor de Watchmen e muitos outros clássicos dos quadrinhos contemporâneos inicia sua visão sobre a cidade em 4000 a.C., nas palavras de um menino no neolítico. Este primeiro conto é um dos mais difíceis do livro, pela escrita extremamente pobre e truncada, sem nenhum respeito por regras ou pontuações, o que causa muita estranheza nos leitores, mas ela dá o tom de todo o resto da obra: criatividade e recurso para escrever cada um dos contos de forma distinta, numa caracterização realista de cada narrador. Na pele de um juiz do século XVII, por exemplo, Moore adota um estilo sofisticado, muito prazeroso de ler, enquanto as palavras de um louco do século XIX irritam, as de uma vigarista da Idade dos Metais causam repulsa, as de um oficial do Império Romano convencem o leitor de suas convicções sobre Roma. Cada conto se interliga com o seguinte de forma sutil, até culminar em 1995, nas visão do próprio autor sobre a cidade em seu tempo.

Além de sua poderosa e criativa escrita, Alan Moore também tem a seu favor uma grande capacidade de produzir uma história com sentidos ambíguos, pouco clara, que dá margem à imaginação e ao gosto do leitor. Os temas místicos e fantasiosos, marcantes na carreira do autor nos quadrinhos, não deixam de aparecer, mas de forma que podem ser entendidos como acontecimentos sobrenaturais ou simplesmente uma interpretação da realidade, como a loucura, coincidência ou a impressão de personagens sobre passagens anteriores do livro.

A Voz do Fogo não é um livro muito fácil, daquelas leituras de passatempo que logo se esquece. É leitura densa, para ficar pensando após o término de cada conto, escrita bonita para ser admirada, para depois ficar tentando decifrar a mente do autor, de como ele teve a ideia de criar tal história. E não é daqueles livros para pegar emprestado, esse é para guardar e reler de vez em quando. Só é uma pena que tenha sido o único, até agora, na premiada carreira de Alan Moore, que já disse ter mais um ou dois livros na cabeça, esperando um tempo entre os trabalhos dele para serem escritos.

Editora: Conrad
Páginas: 331
Disponibilidade: normal
Avaliação: * * * * *

Livro Digital

Uma resposta de Alan Moore sobre o livro:

G1 – Você certamente conhece um bocado sobre Northampton. Escreveu um livro inteiro só sobre ela, não?

Moore - Sim, tenho uma paixão incrível por Northampton. Escrevi “Voz do fogo”, que era ambientando inteiro em Northampton ao longo de 6 mil anos de sua história. São 300 páginas, mas achei que era um livro muito cosmopolita e abrangente. Então, no novo livro que estou escrevendo, decidi focar em apenas alguns quarteirões de Northampton. “Jerusalém” fala do 1,5 Km2 em que eu cresci. Deverá ter algo como 1.500 páginas. E, provavelmente, o próximo vai ter 8 mil páginas e será só sobre a minha sala de estar (risos). Por um lado, é uma cidade fascinante, a quantidade de história e de eventos estranhos que aconteceram aqui são impressionantes.Mas não estou dizendo que esse lugar é mais importante ou mais extraordinário do que onde qualquer outra pessoa vive. É só o lugar onde eu vivo. E o que estou fazendo por Northampton, que aparentemente é só uma cidade cinzenta e sem graça, é usar minha escrita para transformá-la na cidade de maravilhas que existe dentro da minha cabeça. Acho que muitos artistas se beneficiariam se dessem uma olhada fresca sobre a cidade em que vivem. Faça observações poéticas, tente sentir que é um local maravilhoso. Suspeito que se sentimos que o lugar que estamos vivendo é uma droga, eventualmente chegaremos a conclusão que nós somos uma droga. Por outro lado, se você pensar que o lugar que vive é um templo celestial cheio de seres maravilhosos, nós mesmos nos sentiremos assim.

O resto da entrevista, onde ele fala sobre diversas coisas como pornografia, filmes de Hollywood, Paulo Coelho e Harry Potter, aqui.


quarta-feira, 18 de agosto de 2010

O Imperador-Deus de Duna - Frank Herbert

A grande saga de Duna continua, 3500 anos após os acontecimentos da primeira trilogia. Obviamente, a trama conta com personagens totalmente distintos - exceto o próprio imperador-deus, que por não ser um humano comum, vive durante todos estes anos, e Duncan Idaho, o personagem predileto de Frank Herbert que aparece em todos os livros da série em corpos clonados -, mas não falta nada dos livros anteriores para quem é fã de Duna: todos os conceitos, ideias, tecnologias originais e organizações que manipulam os rumos do universo estão lá.

Até agora, esta foi a continuação de Duna que mais gostei. Assim como o primeiro livro, O Imperador-Deus de Duna não tem uma história surpreendente, e não são necessárias muitas páginas para saber que rumo a trama vai seguir, mas ainda assim o livro é fascinante e pede para ser lido com voracidade. A ótima escrita de Frank Herbert, as divagações dos personagens e a discussão de temas muito pertinentes a qualquer sociedade como política, religião, ética e problemas existenciais, tudo isso me leva a confirmar minhas opiniões sobre a série expostas nas resenhas dos livros anteriores.

E a saga continua.

Editora: Nova Fronteira
Páginas: 504
Disponibilidade: esgotado
Avaliação: * * * * *

Livro Digital