segunda-feira, 2 de maio de 2011

Doutor Jivago - Boris Pasternak


Doutor Jivago é um livro ambientado na Revolução Russa, que deu origem a um filme famoso da década de 60, isso era tudo o que eu sabia quando peguei-o para ler. Ficção histórica, bacana. Após ler mais ou menos até a metade, descobri outras duas coisas a respeito do livro de Boris Pasternak: tem uma trama interessante, com personagens bem elaborados, mas é um dos livros mais chatos da história da literatura!

A história de Doutor Jivago começa na convulsiva Rússia da virada do século XX, e a vida pessoal do protagonista contrasta intencionalmente com o pano de fundo histórico das lutas políticas que desembocaram na revolução dos bolcheviques: a trajetória do médico Iuri Andreievitch Jivago representa a individualidade sufocada pelo coletivismo extremo e forçado dos revolucionários marxistas, e além disso, o livro abre espaço para a discussão sobre a distorção dos ideais revolucionários através do processo histórico.

Aí entra a diferença entre criar grandes histórias e ter capacidade para desenvolvê-las. A escrita de Boris Pasternak é barroca até o tutano, repleta de figuras de linguagem pedantes, produzindo uma leitura cansativa, um desafio até para os maiores maratonistas literários - intercalando esta com diversas outras leituras, demorei quase três meses para sequer chegar à metade dessa grande epopeia eslava, mas então desisti no meio do caminho, abandonei mesmo, não tive forças para tamanha provação. Para se ter uma ideia do que estou falando, um dos temas mais destacados em qualquer resumo rápido que se pegue sobre Doutor Jivago é o romance entre o protagonista e a personagem Lara, mas até onde li, nem sinal de que isso estava para acontecer... aliás, a impressão é de que nada acontece nesse livro! Talvez tenha sido uma estratégia do autor para remeter à solidão de Jivago, ao mesmo tempo que à imensidão da natureza russa, aquela paisagem monótona, a tundra, as coníferas, a Sibéria, o Círculo Polar Ártico, gelo, neve...

Ainda assim, Doutor Jivago foi considerado digno de um Prêmio Nobel de Literatura em 1958, mas expliquemos: o livro foi censurado na União Soviética, chegou clandestinamente ao ocidente, denunciava os erros do socialismo soviético, o autor ainda vivia lá cercado de agentes da KGB, e era época de Guerra Fria e tudo mais, entenderam, né? Por mais que possam defender a qualidade desse livro e dizer (corretamente) que eu não entendo patavina de técnicas literárias para poder criticar assim, continuo achando que não tem desculpa: o livro foi escrito e publicado na época mais fértil da literatura mundial, de gente como Kafka, Fitzgerald e Borges, não havia espaço para uma escrita anacrônica dessa. Que os acadêmicos julguem os méritos literários dos autores através do tempo, para mim Pasternak já está no grupo encabeçado por Stendhal: literatura clássica chata que ninguém aguenta, mas ai de quem falar mal!

Mesmo com todos os problemas, a história por trás da enrolação de Doutor Jivago ainda me parece interessante, e eu poderia simplesmente ler qualquer resumo na internet para saber como termina, mas farei de outra forma: vou procurar o filme, que pode até ser ruim como o livro (e provavelmente é, já que ganhou cinco estatuetas do Oscar), porém apresenta uma música muito bonita e belíssimas atrizes (tanto na versão original, de 3 horas de duração, como na série de tv de 2002, com 6 horas).

Editora: Best Seller
Páginas: 756 (com sensação térmica de 3756)
Disponibilidade: normal
Avaliação: * *

2 comentários:

  1. Como criticar uma opinião pessoal sobre algo tão pessoal como a leitura de um livro, e todas as emoções que esta leitura proporcionou ao leitor.

    Apesar de discordar de você, entendo o quer dizer ao chamar o livro de "chato".

    Tenho a edição portuguesa de 2008, lançada em comemoração aos 50 anos da obra, e importante, pela primeira vez traduzida direto do russo para o português.

    Todas as versões lançadas no Brasil foram traduzidas do francês ou do inglês. E isso faz muita diferença.

    Mas realmente ler Pasternark é tarefa complicada. Trata-se de um autor russo do século XX que escreve, quase, como os russos do século XIX.

    Stendhal também é uma leitura árida, digamos.

    Acho a estória de Lara e Iura absolutamente arrebatadora, por todo o conjunto da obra, o sofrimento humano sob o pano de fundo da revolução russa... vi o filme trocentas vezes...

    Acho o filme excelente, um clássico absoluto, mas o livro é muito, mas muito superior.

    No livro existem talvez quatro vezes mais personagens, além de incontáveis passagens que são omitidas no filme.

    Um livro que abandonei diversas vezes, que é a minha grande "trava" literária, é "Ulysses" de James Joyce. Isso me incomoda. Antes de partir desta pretendo encarar Ulysses até o fim.

    Recomendo que o faça com Doutor Jivago, pessoalmente acho que vale a pena...

    A melhor coisa que acho em Pasternark é sua crença nos homens bons, mas não na humanidade...

    Boas leituras...

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    1. Engraçado, mas Ulysses é para mim o livro absoluto! Comecei a lê-lo há um ano, mas já percebi que será uma leitura para o resto da minha vida. Estou estudando a obra a fundo e já até viajei para Dublin exclusivamente por causa disso.

      Enfim, muito mais do que uma "questão de gosto", para mim o que faz uma pessoa gostar ou não de um livro, achar "legal" ou "chato", é uma soma de fatores como experiências pessoais, fase da vida da pessoa, e muito disso que você falou também sobre a tradução, a edição, etc. Leituras de apoio também são muito importantes para determinadas obras. Para Ulysses, isso é fundamental, pois é um livro dificílimo. Também acho que seja um livro intraduzível, por isso leio no original, apesar de todas as dificuldades. Infelizmente não tenho como ler os livros russos no original, mas se a literatura russa fosse minha paixão, certamente aprenderia o idioma.

      Fico feliz com seus comentários amistosos. Muita gente não consegue entender que esse não é um blog de crítica literária, mas de comentários sobre minhas impressões das minhas leituras e um espaço para trocar ideias com pessoas que amam os livros como eu. Às vezes recebo comentários grosseiros porque falei que achei um determinado livro "chato", e não entendo como as pessoas podem transformar seu lazer numa cruzada ou um tipo de guerra religiosa.

      As opiniões de outros leitores, principalmente as divergentes das minhas (bem como aquelas com o intuito de retificar ou acrescentar informações aos meus textos) são para mim fundamentais, e a partir do momento que são postadas devem ser compreendidas como parte do texto em si.

      Obrigado Allysson, e boas leituras!

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