Um livro com este título tem tudo para ser um autoajuda brabo, daqueles bem oportunistas que pegam carona com outros do mesmo naipe (tipo, "O Monge e o Executivo"). Foi justamente isso que pensei quando me foi recomendada sua leitura por um amigo, mas na verdade não tem nada a ver, e depois de um esclarecimento sobre o tema de "O Monge e o Filósofo - O Budismo Hoje", peguei emprestado e li.
"O Monge e o Filósofo" é a transcrição de conversas entre o filósofo francês Jean-François Revel e o monge budista Matthieu Ricard, sobre vários aspectos do budismo, e os contrapontos com a ciência e a filosofia ocidental. Só com esta chamada já se trataria de um livro bem interessante sobre o contato e as contradições entre Oriente e Ocidente, mas há algo mais que torna a experiência única: os autores são pai e filho. Revel, que faleceu em 2006, era um ilustre membro da Academia francesa e sempre foi ateu, criando seu filho sem nenhum tipo de educação religiosa. Matthieu seguiu a tradição familiar até certo ponto de sua vida. Chegou ao doutorado de Estado (título acadêmico mais alto na França) em biologia molecular, mas em 1972 largou tudo para viver como monge na Ásia.
Em 1996, em ocasião da visita de Dalai-Lama à França (que teve Matthieu como seu guia), a mídia noticiou a singular situação com alarde, já que pai e filho supostamente não se viam desde a mudança de Matthieu. Tudo não passava de especulação ou sensacionalismo, pois o próprio Revel afirmou que houve diversos encontros entre eles durante as duas décadas da vida monástica do filho, tanto na Ásia como na França, ocorrendo muitas conversas a respeito da nova vida de Matthieu nestas oportunidades. Daí a ideia de colocar no papel todas essas informações sobre o budismo, que na década de 1990 conhecia uma expressiva escalada no Ocidente, vindas de alguém de origem ocidental - portanto, consciente de como funciona nossa mentalidade.
O primeiro tema abordado não poderia deixar de ser o mais intrigante: os motivos da conversão de um cientista bem encaminhado na carreira para uma vida de meditação e contemplação. Seguem-se então vários capítulos com questionamentos do filósofo a respeito de diversos temas, como a questão sobre o budismo ser ou não uma religião, sua relação com o Ocidente, sua atuação no mundo, o domínio chinês no Tibete, sua história, etc. O maior destaque nisso tudo é a atuação de Revel, contrapondo as informações cedidas por Matthieu, diferenciando "O Monge e o Filósofo" de um simples livro sobre o budismo entre tantos no mercado. Em muitos momentos, Revel, filósofo experiente em discussões intelectuais, coloca em xeque várias inconsistências e contradições do discurso de Matthieu, o que é muito interessante. Ao final, Matthieu tenta dar o troco no capítulo "O monge interroga o filósofo", quando o mesmo tipo de questões feitas durante todo o livro por Revel são então feitas por Matthieu - algo do tipo "qual é o sentido da vida" para um ocidental.
Para quem procura entender algo sobre o budismo além de karma, samsara e nirvana, e ao mesmo tempo ter uma aula de filosofia, "O monge e o Filósofo" é uma bela leitura. Este livro está esgotado, e não consegui encontrá-lo nem na Estante Virtual, mas uma pesquisa rápida na internet me fez descobrir que Jean-François Revel tem livros com títulos bastante interessantes, como "Nem Marx, nem Jesus" e "A Tentação Totalitária", a conferir seus conteúdos no futuro. Matthieu Ricard também já publicou outros livros sobre o budismo, mas certamente de opiniões apaixonadas e sem a graça deste.
Editora: Mandarim
Páginas: 288
Disponibilidade: esgotado
Avaliação: * * * *
Nota: A edição que li tem uma capa diferente, acho que a que está acima é da edição portuguesa.
Nota 2: Agradecimento ao dono do livro, Diogo Menezes, mais um amigo a colaborar com o blog. Daqui a uns 5 anos, quando eu arrumar minha estante e lembrar que o livro ainda está comigo, eu te devolvo!
Sensacional, cara! Fiquei com ainda mais vontade de ler esse livro!
ResponderExcluirLê sim que é bacana.
ResponderExcluir