O que esperar de uma autobiografia de alguém que usou tantas drogas que não consegue se lembrar de metade do que passou na vida? A resposta evidente é a metade de uma autobiografia misturada com um monte de histórias bobas fantasiadas ou, no máximo, "aumentadas mas não inventadas". É mais ou menos por aí que deve ser encarado esse Eu Sou Ozzy, escrito pelo comediante Ozzy Osbourne.
Quer dizer, "escrito" é um eufemismo elogioso para, no máximo, narrado oralmente, pois pelo que se conhece de Ozzy e pelo que ele mesmo diz no livro, dificilmente ele teria capacidade para redigir um texto com mais de três parágrafos sozinho. O ghost writer encarregado em passar para o papel as histórias escabrosas de Ozzy chama-se Chris Ayres, e ele tenta ao máximo reproduzir a linguagem chula e primária do vocalista do Black Sabbath para dar um ar de autenticidade à narrativa do ídolo metaleiro. Se isso por um lado isso produz um texto tosco e difícil de ser levado a sério, a contrapartida positiva é que a leitura torna-se bastante fácil e rápida. Afinal, o que sobra mesmo são as histórias engraçadas e passagens curiosas para quem gosta de rock.
Desde o começo já se percebe que a piada é o tom do livro. Antes de ser cantor, Ozzy é um showman, um palhaço, um bobalhão. Tudo quanto é passagem de sua vida é narrada como uma comédia pastelão, até as coisas mais sérias, como seus dias na prisão, doenças, acidentes, excessos de drogas - aliás, justamente por isso a mídia teve a ideia de transformar sua vida familiar num reality show. Da sua infância humilde, passando por sua juventude sem perspectivas na classe trabalhadora inglesa, chega-se logo ao que todos querem saber: sua carreira no Black Sabbath e as doideiras do mundo do rock.
É claro que tudo não passa de histórias inventadas, floreadas, enfeitadas com glamour de bom humor, mas nem por o livro deixa de apresentar bons aspectos. Primeiro que é bem engraçado, dá para se divertir um bocado com algumas dessas histórias bobas. E segundo que, apesar de toda a fantasia e o besteirol, Ozzy não esconde quem realmente é como pessoa, intencionalmente ou não. Independente das cores com que trata suas histórias, fica claro que Ozzy é um completo idiota que age de maneira semelhante a qualquer Luciano Huck ou Ivete Sangalo da vida: só quer saber de ganhar dinheiro e gastar da maneira que mais lhe agradar, o que eu encaro como uma grande ofensa ao rock, um estilo musical que tem a rebeldia como substância desde seus primórdios. Tanto é que, lamentavelmente, Ozzy prefere falar mais sobre seus discos de platina e suas turnês milionárias do que de suas composições em si - quer dizer, das composições de seus parceiros musicais que ele interpretava, pois ele deixa bem claro que o processo de composição do Black Sabbath passava primordialmente por Tony Iommi e Geezer Butler. Fora tudo isso, ainda tem espaço para todas as besteiras inconsequentes que sempre marcaram a vida de Ozzy, como a crueldade com animais (e não estou falando só da lenda do morcego, que por sinal ele dá sua versão também).
Eu sou Ozzy é um apanhado de babaquices, ora engraçadas, ora de mau gosto. Não se justifica como um livro, pela sua falta de qualidade literária. Seu conteúdo seria mais indicado para um documentário ou um programa de tv, mas esse tipo de livro está aí nas livrarias porque tem mercado, pessoas que não têm o costume de ler, como as que compram A Cabana ou os livros do padre Marcelo - ou no caso, os fãs de Ozzy, subestimados ou não. As histórias do mundo do rock sempre me interessam, e confesso que curti as passagens em que Ozzy nos conta sobre a genialidade de Tony Iommi, a morte de Randy Rhoads ou a ditadura de Ian Anderson no Jethro Tull, mas logo torci para que terminasse e eu voltasse para o mundo dos livros de verdade, que é o que realmente me interessa.
Editora: Benvirá
Páginas: 416
Disponibilidade: normal
Avaliação: * *
Editora: Benvirá
Páginas: 416
Disponibilidade: normal
Avaliação: * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário